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"Os Sons de um Povo" - Introdução

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(Fotografia de António Arrais)



Não faz ainda um século que a cidade conquistou o campo – estamos apenas na segunda geração em que o pensamento urbano se sobrepõe à vivência natural das comunidades rurais, em que a valorização de um terreno é feita em prol do seu potencial turístico em vez da cultura que o viu nascer, em que a mística de uma lenda local que veio dos montes é abandonada e deixada nos montes até desvanecer.


Em tempos não tão distantes, todo o ambiente sonoro era um ambiente musical, exclusivo da paisagem que o fazia cantar. A indiferença do vento para com os lamentos de mulheres a mondar a terra, a atenção de um pífaro que observa a altivez dos cavalos selvagens à procura do seu destino do topo de uma montanha, a euforia da altura da escolha do par para dançar aquando dos bailaricos ocasionais na aldeia – são estes os sons que compõem um povo. Mais do que cultura, estes ambientes musicais, independentes de influências externas com base na transformação de sons em produtos a comercializar, são a própria identidade de toda uma região.


Ora, de maneira a poder saltar a barreira industrial que separa o ouvido da música, na mais pura das suas interpretações, é necessário ir diretamente à fonte que a origina. E é isso que “Os sons de um povo” procura fazer - mergulhar no património social de uma comunidade, com o objetivo de criar uma coletânea de histórias que retratam o estado do panorama da cultura popular nos dias que decorrem. Isto implica não só divulgar o importante trabalho dos grupos folclóricos em perpetuar no tempo o modo de vida e os costumes dos seus antecessores, mas também conhecer as memórias, lendas, pessoas e locais que inspiraram a sua obra. São estes, a par com os resistentes que aceitam as suas raízes para tornar as suas criações numa extensão do seu povo, que mantêm o folclore português vivo.


“Os sons de um povo” é, portanto, uma viagem musical, em que cada local de paragem no seu caminho é um arquivo das gentes que o habitam, através dos sons que produzem. Para que se respeite na íntegra o contexto original da expressão criativa em causa, essa árdua tarefa de escrever a tinta permanente a poesia vivida e cantada por um povo será feita pela mão do próprio povo, sem qualquer filtro para com a visão que deu origem à sua arte.


Por homenagem a quem se refugia nos rochedos de cada colina da charneca, nas margens de cada ribeiro da lezíria, nas falésias de cada recorte de areia junto ao mar, no alto de cada serra, ou no beco mais escuro de cada bairro, com o desejo secreto de um dia poder ser ouvido a cantar a sua existência. Porque é por cada uma destas vozes que persistem, que os sítios aonde pertencem permanecem intactos apesar de todas as cedências perante o urbanismo e o industrial a acontecer à sua volta. E em “Os sons de um povo”, percebemos que estes sítios, no final de contas, são a nossa razão de ser.

 



Martinho Cruz



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