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Arrepiada com Julia Mestre

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Bala Desejo é hoje um nome incontornável na nova geração da Música Popular Brasileira. A história da formação deste grupo e da composição do icónico álbum SIM SIM SIM, premiado em 2022 com o Grammy Latino de Melhor Álbum de Pop Contemporâneo em Língua Portuguesa, é já conhecida: em 2020, durante o confinamento, a cantora e compositora carioca Julia Mestre convidou Dora Morelenbaum, Lucas Nunes e Zé Ibarra, seus amigos de infância, para se mudarem para o seu apartamento em Copacabana[1]. Durante os meses de confinamento que se seguiram, vivendo numa espécie de república musical, os quatro músicos estiveram imersos no processo de composição e gravação das faixas que viria a culminar em SIM SIM SIM.


O que é menos sabido é que, paralelamente, durante este período, Julia Mestre foi-se dedicando ao seu projeto a solo, compondo sozinha ou com amigos e gravando em casa de Lux Ferreira. Este intenso trabalho durante o confinamento resultou no lançamento do seu segundo álbum a solo, de seu nome Arrepiada, em abril do ano passado. Neste disco, encontramos uma Julia Mestre muito diferente da que ouvíamos em Geminis, o seu álbum de estreia, lançado em 2019, altura em que a compositora, baixista e cantora ainda se via como uma “menina-mulher”. Ouvimos em Arrepiada uma sonoridade próxima à dos temas de Rita Lee gravados e interpretados por Julia Mestre, em 2020, numa homenagem a esta artista.


Em Arrepiada, Julia Mestre dá-nos a conhecer um pouco mais do seu universo quente e colorido. É uma amálgama de sonoridades diferentes, que conjuga criativamente elementos de pop, música eletrónica, forró e até reggae. Para além dos seus companheiros de Bala Desejo, o disco conta ainda com a colaboração de músicos que hoje se destacam no panorama da música brasileira – Ana Caetano, João Gil e a dupla de produtores musicais Lux Ferreira e Tróia – e também a cantora portuguesa MARO, que participa na faixa “Sonhos & Ilusões”.


Desde o primeiro momento de música, a cantora e compositora é clara nas suas intenções e a faixa com que o álbum se inicia – e que dá nome ao disco – é, pelas palavras da própria, “um grito de Liberdade”. Esta faixa, que inaugura um disco que pretende ser “uma força que quer contagiar, que quer cutucar, que quer empoderar, que quer abraçar outras mulheres”[2], dá o mote para 38 minutos de tropicalismo, sensibilidade e muita beleza. É impossível ficarmos indiferentes ao carisma de “Chuva de Caju” e à ternura de “Menino Bonito” e não nos revermos nas palavras de saudade e perda cantadas por Julia Mestre em “Forró da Solidão”, mas o clímax de Arrepiada é em “Meu Paraíso”, uma música com uma energia inebriante feita em colaboração com Lux & Tróia. A sexta faixa deste álbum inicia-se com os familiares versos “As águas dos rios colorem a mata de imensidão /É azul, é verde, é marrom”, popularizados por Bala Desejo. Nesta faixa, “Clama Floresta” ganha uma nova roupagem, que lhe assenta perfeitamente, num registo um pouco mais contido.


Termino este texto com aquela que é a minha música preferida de Arrepiada: “Deusa Inebriante”. Nesta música, Júlia Mestre parece encenar uma dança com a morte, ao som de uma delicada guitarra e de uma percussão omnipresente, e confessa cantando “Eu tenho medo do sono profundo”. Julia Mestre, numa entrevista à Papel Pop[3], sobre esta canção, que surgiu na sequência da morte do seu avô, diz: “Tentei extrair poesia daquilo, imaginei como seria a partida dele se estivesse sonhando e uma deusa aparecesse. (…). Meu desejo é tentar extrair magia dessa e de outras situações que são comuns, duras demais.” E esta artista extrai mesmo magia de todo e qualquer lugar. Júlia Mestre tem algo de fantástico, tem uma aura misteriosa, como diria uma criança, parece uma fada: a sua voz, que neste disco aparece num registo grave, é docemente mágica e as suas palavras ternas surtem uma energia íntima.


Arrepiada fala de amor, paixão, solidão, maternidade e morte. É um álbum que colhe os momentos mais apaixonados da vida e também os mais ternos. É um disco imperdível.



Sara Cal


[1] https://veja.abril.com.br/coluna/o-som-e-a-furia/a-peculiar-nostalgia-moderna-cultivada-pela-nova-geracao-da-mpb


[2] https://www.ruc.pt/cronica/2023/09/28/julia-mestre-estreia-se-a-solo-em-coimbra-com-arrepiada


[3] https://www.google.com/urlsa=t&rct=j&q=&esrc=s&source=web&cd=&ved=2ahUKEwi0v4zdoZmEAxVh_0HHRr0CQoQFnoECA8QAQ&url=https%3A%2F%2Fwww.papelpop.com%2F2023%2F04%2Fentrevista-a-possibilidade-do-novo-e-o-que-me-arrepia-diz-julia-mestre-sobre-2o-album-solo%2F&usg=AOvVaw33yrKFbGyJLXCrqnAbv9VW&opi=89978449



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