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Jorge Palma e as suas 70 voltas ao Sol

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Fotografia retirada do Facebook oficial do Jorge Palma

“Estão todos convidados para a festa dos 70 anos de Jorge Palma” , anunciava a EGEAC, em setembro de 2020. Aproximadamente três meses depois de fazer 70 anos, Jorge Palma, músico que dispensa apresentações, cantava e tocava, no Castelo de São Jorge, algumas das muitas músicas que tornam o seu percurso no mundo da música precioso, acompanhado por uma orquestra de câmara com 14 elementos, dirigida pelo Maestro Cesário Costa. Este espetáculo, de seu nome “Jorge Palma – 70 voltas ao Sol”, foi transmitido em direto nas redes sociais e gravado, sendo lançado, pouco tempo depois, o respetivo disco ao vivo (editado em CD e em vinil). O concerto decorreu no âmbito da programação “Cultura na Rua” e, no final do espetáculo, o artista septuagenário recebeu a Medalha de Mérito Cultural de Lisboa.

Já em 2021, foram anunciadas novas datas deste espetáculo para Lisboa e para o Porto. No dia 22 de dezembro, dirigi-me expectante para o CCB, sem ter ouvido a gravação do concerto do Castelo de São Jorge, e curiosa sobre como soaria a música de Jorge Palma acompanhada por uma orquestra. Jorge Palma subiu ao palco e a sala inundou-se de aplausos. A energia da plateia e os calorosos aplausos mostraram o enorme carinho do público pela sua música. Estabeleceu-se um ambiente cúmplice e de genuíno festejo da longa e bonita carreira deste músico que marcou para sempre o rock português.

Jorge Palma cantou as músicas que não podia deixar de cantar e muitas outras bonitas composições: “Quem és tu, de novo”, “Bairro do Amor” e “Deixa-me Rir” foram tocadas na parte inicial do concerto; pouco tempo depois, ouvimos “O Lado Errado da Noite”, tema que deu nome a um dos seus álbuns mais bem-sucedidos, e “Frágil”, com um arranjo diferente mas mantendo o caráter ritmado a que estamos acostumados; mais para o final do concerto, destaco “Só”, com um arranjo leve e requintado, e “Portugal, Portugal”. É também de realçar a participação de Cristina Branco, que nos surpreendeu a meio de “Estrela do Mar”, uma música acompanhada apenas ao piano.

Filipe Melo e Filipe Raposo, músicos por quem Jorge Palma tem “muito apreço”, foram os responsáveis pelos arranjos e orquestrações das 16 músicas. Talvez por ter tido más experiências com rock sinfónico, sempre achei um pouco arriscada a escolha de repertório pop e rock para orquestras. Mas, neste caso, a junção do som dos instrumentos de orquestra com o som do piano e com a voz de Jorge Palma soou-me rica e orgânica. A orquestração da música de Jorge Palma funcionou muito bem, não só pela qualidade dos arranjos, mas também pela formação musical erudita do artista e pelas marcas que esta deixou nas suas composições. Neste concerto, Jorge Palma apresentou-se não só como o icónico músico de rock que há muito conhecemos, mas também como um eterno pianista, desta vez ao lado de uma orquestra. E Palma pareceu sentir-se confortável com qualquer uma dessas suas facetas, que conciliou de forma harmoniosa - algo que nem sempre aconteceu na sua vida.

De facto, Jorge Palma começou a estudar piano aos 6 anos e, em 1962, chegou a ganhar o segundo prémio no concurso integrado nos festivais da Juventude Musical. No entanto, aos 14 anos, começou a dedicar-se mais ao pop-rock, em detrimento da música clássica. Nas suas palavras: “Eu tive consciência, por volta dos 14 anos, que não ia ser um solista de concerto. Esse pessoal sofre muito! Eu nunca tive um esquema de disciplina… não dava com o meu feitio estar 8 ou 10 horas por dia agarrado ao instrumento.” Em 1967, Jorge Palma integrou a banda Black Boys e, em 1969, a banda de hard-rock/jazz-rock Sindikato, que marcariam o início da sua carreira no mundo da música pop. Mas o músico nunca “perdeu o piano de vista”: “O piano foi uma constante, nunca deixou de ser, mesmo naqueles anos em que andava na estrada”. Mais tarde, retomou os seus estudos formais de piano e, em 1986, concluiu o Curso Geral de Piano, ao mesmo tempo que gravava “Quarto Minguante”, o seu sétimo álbum. Em 1990, finalizou o Curso Superior de Piano do Conservatório de Lisboa e, no ano seguinte, editou “Só”. Foi, assim, um período marcado por um encontro entre dois mundos distintos e que Jorge Palma demonstrou que não são incompatíveis. Imediatamente antes da versão de “Canção de Lisboa” tocada no concerto, por exemplo, foi tocado um excerto da 1ª Sinfonia de Mahler (“O Funeral do Caçador”), que transitou, de uma maneira quase subtil, para um dos grandes êxitos de Palma.

Entre as músicas, Palma explicou a origem de várias canções, fazendo referências a memórias, contando histórias antigas. Desculpou-se da sua tosse, riu e fez rir o público, falou de uma ex-namorada francesa, de cartas trocadas com Herberto Hélder, de conversas com Carlos do Carmo. “A vida real não se afasta muito do que mostro no palco” , diz-nos o músico e talvez por isso nos pareça tão genuíno e próximo. Por momentos, temos a ilusão de o conhecer, de ser uma espécie de parente afastado que raramente vemos, mas que gostamos sempre de reencontrar e cujas histórias têm algo que nos faz invariavelmente sorrir.

O concerto terminou com a música “A gente vai continuar”, que foi tocada duas vezes, devido às palmas persistentes do público, que pedia um encore. A escolha das palavras desta canção foi suficientemente hábil para evitar que a canção ficasse datada ou associada a um tema em particular e penso que essa também é parte da beleza desta música. De facto, o letrista procura ser subtil, evitando especificar acontecimentos e fazer referências muito explícitas: “Quando escrevo faço questão de não datar muito as coisas. Sou mais universalista, mais abrangente. Gosto de falar de coisas que nos tocam desde o princípio da Humanidade até ao infinito” . Apesar de vaga, a letra desta música é carregada de esperança e, quando conjugada com a melodia, torna-se uma canção com uma força inabalável. A noite culminou num momento verdadeiramente emocionante em que a plateia cantava a uma só voz “A gente vai continuar / Enquanto houver estrada pra andar / (…) A gente não vai parar / Enquanto houver ventos e mar”, palavras que ganharam um sentido especial neste concerto de comemoração dos 70 anos e da carreira de Jorge Palma.

“O que tenho de fazer é escrever de forma que eu goste até ao fim da minha vida. E é isso que tenho feito” . Estas são palavras de Jorge Palma que recupero agora para partilhar o desejo que o continue a fazer.

Sara Cal

[1] Retirado de https://news.cision.com/pt/egeac/r/estao-todos-convidados-para-a-festa-dos-70-anos-de-jorge-palma,c637353340970000000

[2] Retirado de https://expresso.pt/blitz/ (artigo temporariamente indisponível, devido ao ataque informático de que a Blitz foi alvo)

[3] Retirado de https://expresso.pt/blitz/ (artigo temporariamente indisponível, devido ao ataque informático de que a Blitz foi alvo)

[4] Retirado de http://www.ci.uc.pt/pessoal/ruineves/jorgepalma/entrevista3.html

[5] Retirado de https://radiocomercial.iol.pt/noticias/116945/jorge-palma-a-musica-e-liberdade

[6] Retirado de https://ionline.sapo.pt/artigo/754147/jorge-palma-a-liberdade-para-mim-e-vestir-me-como-me-apetece-escrever-e-compor-o-que-me-apetece?seccao=Mais_

Palavras-chave: “música portuguesa”; “rock português”; “orquestra de câmara”; “piano”.

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